quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Instalação do município de Lima Duarte


    As primeiras autoridades municipais de Lima Duarte tomaram posse em 29 de dezembro de 1884, três anos após a criação do município.Conforme o Decreto Regencial de 13 de Novembro de 1832, cabia ao Presidente da Câmara do municipio de origem do distrito emancipado a sua instalação.

    

Antonio Carlos Ribeiro de Andrada.
Na foto, sentado no canto inferior direito,
ao lado de sua esposa.
1895


Como pertencíamos a Barbacena, coube ao Agente Executivo Municipal e Presidente da Câmara de Barbacena Dr. Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, também chamado Antonio Carlos III, (não confundir com seu filho Antonio Carlos,que governou o Estado de Minas Gerais na década de 1930), instalar nosso municipio. Antonio Carlos desceu de Barbacena, acompanhado de seu secretário Cristóvão Colombo e comitiva, e veio ter ao Rio do Peixe, agora cidade de Lima Duarte.

    A ata de instalação do municipio, preservada na Câmara Municipal de Lima Duarte nos dá os detalhes desta solenidade, que aqui resumimos.

    O presidente da Câmara de Barbacena abriu os trabalhos no Salão Nobre do Paço da Câmara, na presença dos vereadores eleitos e grande massa popular. Inicialmente, declarou aberta a sessão, convidado para secretario ad hoc Cristóvão Colombo. Em seguida, declarou em voa alta que tendo sido criado pela Assembleia Provincial o Municipio do Rio do Peixe, vinha em cumprimento à Lei, ouvir o juramento e dar posse aos vereadores eleitos para compor a Câmara do novo município, lavrando o auto de instalação.

    Em ato contínuo, ordenou ao secretario que lesse a ata da apuração da eleição dos vereadores, procedendo à chamada dos mesmos, os quais, um a um, punha a mão direita sobre o Livro dos Santos Evangelhos e prometiam em nome de Deus, bem servir ao cargo de vereador do município.

    Foram os primeiros vereadores do Rio do Peixe, eleitos em 07 de setembro de 1884, os senhores:

Tenente Coronel João de Deus Duque

João Antonio de Paiva

Manoel José Rodrigues

Manoel Antonio de Almeida Pires

Felício José de Oliveira

Tenente Coronel Joaquim Carlos de Paula

Capitão Manoel Victório Nardy.

    Em seguida, deu posse aos sete primeiros vereadores, os quais escolheram para primeiro Agente Executivo e Presidente da Câmara o Tenente Coronel João de Deus Duque, o qual procedeu em seguida, a nomeação dos primeiros funcionários municipais, bem como a arrecadação dos impostos municipais, antes enviados à Barbacena.

    A ata de instalação do município é importante documento de nossa História e deve ser conhecida de todos os lima duartinos.

    A primeira Câmara Municipal é bem representativa da sociedade de Lima Duarte no final do século XIX: seus componentes, todos proprietários rurais e agronegociantes, representavam as forças produtivas da economia local, ainda hoje baseada na agropecuária e comércio.

    Tal composição da Câmara permanecerá durante até a primeira metade do século XX, alterando-se significamente somente após 1950, quando o “urbano” finalmente começa a prevalecer sobre o rural, gerando o panorama politico que vemos hoje, com bem menos representação da classe rural.

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

A República em Lima Duarte

    A notícia da Proclamação da República e do banimento da Familia Imperial, em 15 de Novembro de 1889, no Rio de Janeiro, demorou alguns dias a chegar a Lima Duarte. Naquela época, os Correios, em lombo de mula, passavam de cinco dias e cinco dias na cidade, fazendo com que as notícias chegassem sempre atrasadas.

    

Proclamação da Republica
Henrique Bernadelli

Confirmados os fatos pelos jornais, alguns cidadãos logo se manifestaram e convocaram a Câmara Municipal, que em caráter extraordinário, se reuniu no dia 23 de novembro de 1889, afim de deliberar sobre o fato, aderindo unanimemente à nova forma de governo.

       O povo, acompanhando a banda de Música Sagrado Coração de Jesus, invadiu o Paço da Câmara, portando bandeiras, estandartes e flâmulas de cores e símbolos republicanos, esperando ansioso pela Proclamação de Adesão à Republica, feita pelo Secretário da Câmara.

    Este proclamou a adesão do Município de Lima Duarte à nova forma de governo, disto fazendo comunicação ao Governdor do Estado de Minas ao que a população respondeu com vivas à Republica, ao Governo Provisório, ao governador de Minas e à Camara Municipal.

    A banda, arrematando os vivas, tocou A Marselhesa, enquanto todos os presentes assinavam a ata. Discursaram dentre outros, o Capitão Manoel Antonio Duque e o Vigário Padre Pedro Nogueira.

    Finda a cerimônia, saem banda, povo e vereadores em passeata, parando defronte a várias casas de ilustres republicanos, como a casa do Delegado de Polícia, Manoel Duque, Carlos Baumgratz, Manoel Caixeiro e Dr. Vieira Pinto, o qual discursou, saudando

    Da parte do povo, animado pela Marselhesa reiteradas vezes tocada pela banda, irrompiam vivas ao governador de Minas, Cesário Alvim, Bias Fortes e outros. O destacamento do Corpo de Polícia de instante a instante dava uma descarga de tiros de fuzil e de todos os ângulos da cidade ecoavam salvas cuja estampidos aenchiam os ares.

    Mas a festa ainda estava incompleta! O principal líder da cidade, Comendador João de Deus Duque, republicano de longa data, estava já idoso e doente. Incapacitado de comparecer, festejava solitário em sua fazenda no Bom Retiro. A população, solidária, juntou-se à banda, Vigário, Vereadores e Corpo de Policia e partiram todos rumo à fazenda, numa caminhada de dois quilometros.     Lá chegando, em meio a vivas, foguetes, tiros de fuzil e muita música, saudou o velho chefe, em nome do povo, o Vigário Pedro Nogueira, tendo também discursado o escrivão da Coletoria e o professor publico.

    João de Deus Duque, emocionado, agradeceu a presença de todos, e manifestou sua alegria pelo fato de que a vitória republicana tenha sido feita com ordem, prudencia e dedicação, conclamando todos os cidadãos para que ajudassem com o que estivesse a seu alcance afim de se obter a paz, a união e a fraternidade, lamentando não poder estar com o povo pelo estado precário de sua saúde.

    A passeata retornou à cidade às 8 horas da noite. As festas prosseguiram até o feriado do dia 8 de dezembro, encerrando com te Deum na Igreja Matriz, dirigido pelo republicano Vigário Padre Pedro Nogueira.

               Assim começou a República em Lima Duarte!

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

03 ou 30 de ourubro?

 


Independência, autonomia ou apenas mudança de status?

    Quem nasceu primeiro: o ovo, ou a galinha? Apesar da confusão mental causada pela idéia de ser impossivel ter havido uma galinha, sem que houvesse um ovo, é mais inteligente que primeiro um organismo se componha para depois estabelecer sua forma de reprodução.

    Logo, indiscutivelmente se originou o ser, que buscou se reproduzir…

    Pela mesma forma, ocorre com as povoações.

    Na época em que o distrito do Rio do Peixe buscava sua emancipação de Barbacena, no final do século XIX, o Império do Brasil mantinha a organização política herdada de Portugal. Por essa organização, apenas as grandes aglomerações urbanas, dotadas de muitas ruas, edifícios, expressivo comércio, sede de bispado ou função administrativa, tinham o título de cidade, como Salvador (primeira cidade do Brasil) Rio de Janeiro, Paraíba( atual João Pessoa- PB), São Cristóvão – SE, Natal-RN, São Luís – MA, Belém-PA e Recife-PE. As demais povoações sedes de munícipios eram todas designadas como Vilas, muitas delas sendo até capitais de capitanias e províncias.

    Somente em 1823, por um decreto Imperial, todas as vilas capitais de província puderam ser chamadas de “cidade”, caso de Ouro Preto, que foi até esse ano uma vila, a Vila Rica, capital da capitania e província de Minas Gerais. Mariana foi elevada a cidade simplesmente por que nela morava o bispo, e um bispo, como Principe da Igreja, não poderia morar numa vila…

    Algumas vilas foram honradas pelo Imperador com o título de cidade, como forma de distinção, caso por exemplo de Barbacena, designada por Dom Pedro I como “Nobre e Mui Leal Cidade de Barbacena”, por sua fidelidade ao Imperador. Apesar disso, as vilas tinham suas Câmaras Municipais, autonomia administrativa e tributária, sendo cabeça de distrito, as vezes com grande area territorial. Muitas vilas eram sedes de Comarca, com estabelecimento de toda a estrutura judiciária, caso das vilas de Barbacena e Rio das Mortes (São João del Rei). Assim, por exemplo, a vila de Santo Antonio do Paraibuna se separou de Barbacena, em 1850, ganhando somente seis anos depois um titulo de cidade, por seu desenvolvimento.

Com o Rio do Peixe, não foi diferente!

    O distrito buscou na Assembléia em Ouro Preto sua autonomia administrativa e desmembramento de Barbacena, obtendo vitória nessa luta no dia 03 de outubro de 1881, pela Lei Provincial Mineira número 2.804. A sede do novo município era a Vila do Rio do Peixe, que apesar de não ter sido instalado, já havia sido criado por lei, existindo juridicamente.

    A confusão das datas é gerada aqui. Um atraso na instalação do município, fez com que demorassem três anos para sua instalação. O Presidente da Câmara de Barbacena, a quem por lei cabia instalar o novo município dando posse aos primeiros vereadores, retardou ao máximo a instalação, alegando motivos vários, todos sanados pelas lideranças riopeixenses.

    A pendenga só se encerra em 30 de outubro de 1884, quando finalmente os riopeixenses aceitam mudar o nome de sua vila para Cidade de Lima Duarte, homenageando o sogro do Presidente da Câmara de Barbacena, que, lisongeado, vem e instala finalmente o município em 29 de dezembro de 1884 !

    Vale lembrar que alguns municípios comemoram a data de sua instalação, o que também tem sentido lógico, pois passam a existir de fato nesta data. Em resumo: sem correr risco de erro, poderíamos comemorar o 03 de outubro de 1881(emancipação de direito) ou o 29 de dezembro(instalação de fato). Nunca o 30 de outubro, que foi apenas uma mudança de status, aliás bem politiqueira...

    Somente em1938, TODAS as sedes de munícipio foram elevadas à categoria de Cidade, fazendo com que muitos pensassem que era assim desde o início.

    Apesar de no brasão municipal constarem as datas 1781: abertura do territorio à povoação por Dom Rodrigo e 1881: emancipação de Barbacena, houve quem considerasse a data de 30 de outubro 1884, sabe-se lá por que motivo, gerando inclusive uma Lei Municipal criando o Dia do Aniversário da Cidade, em 1976.

    A pesquisadora Maria de Lourdes Sacramento combateu ardorosamente este erro, sendo seus apelos ouvidos pelo então vereador Evandro Fontes de Oliveira, que encampando a idéia, transformou-a em projeto de lei, que aprovado, corrigiu uma distorção histórica de anos.

    A lei, aprovada, e que está em vigor, é a seguinte:


Lei nº 1.023

Altera a data comemorativa do aniversário da cidade.

A CÂMARA MUNICIPAL DE LIMA DUARTE APROVOU, E EU, PREFEITO MUNICIPAL, SANCIONO A PRESENTE LEI:


Art. 1º - Fica o Prefeito Municipal de Lima Duarte, autorizado a celebrar como data oficial do Aniversário de Lima Duarte o dia 03 de outubro de cada ano, que será considerado Feriado Municipal.

Art. 2º - Revogam-se as disposições em contrário, especialmente a Lei 527 de 16 de setembro de 1976.

Art. 3º - Entra esta Lei em vigor em 1º de janeiro de 1998.

Dada e passada na Secretaria da Prefeitura Municipal de Lima Duarte, aos 10 dias do mês de dezembro de 1997.

Sancionada por Ney Carvalho de Paula - Prefeito Municipal


    Apesar da incorreção do texto da lei, o 03 de outubro é a data da emancipação do municipio e não o aniversário da cidade….

    Lembra-se do ovo e da galinha? A cidade, no nosso caso, só poderia vir se antes houvesse a vila e o município. Logo, o que vem primeiro é que deve ser comemorado.

    Por estes “erros”, tivemos um Centenário aos 103 anos….

    Mas aí já é outra estoria….

terça-feira, 6 de setembro de 2022

O Sete de Setembro em outros tempos

 

Comemorações da Independência em Lima Duarte em 1922 e 1936.


    A comemoração do Sete de Setembro fez parte das tradições de Lima Duarte durante muitas décadas, sendo festivamente celebrada com as particularidades de cada época.

    A título de curiosidade reproduzimos a seguir, duas matérias jornalísticas, retratando as comemorações do Sete de Setembro em dois anos: 1922 e 1936.

    Em 1922, o Brasil comemorou o 1º Centenário da Declaração da Independência, festejando o ato do Príncipe Dom Pedro, às margens do riacho Ipiranga.

    As cidades, por todo o país, festejaram a data, cada uma com suas particularidades. Em Lima Duarte, não foi diferente.

    A sociedade se organizou, e manifestou seu contentamento e alegria pela data.

    A única fonte de informação sobre os eventos aqui promovidos, está presente na imprensa carioca, representada pelo jornal A Noite, que tinha grande circulação em Lima Duarte e região, repercutindo aqui as notícias do Rio de Janeiro (então Capital Federal) e as do Brasil.

    Assim noticiou, o jornal A Noite, na edição de 09 de setembro de 1922, o Centenário da Independência em Lima Duarte:


Foi tocante a comemoração do Centenário nesta localidade.Às primeiras horas da manhã do grande dia, uma banda de música, acompanhada doTiro de Guerra 408, percorreu a cidade.

Ao hastear a bandeira, a banda percorreu novamente as ruas, depois de ter prestado homenagens, tocando o Hino Nacional.

Os alunos do Grupo Escolar fizeram passeata, falando por esta ocasião o Dr. Olavo Werneck e o farmacêutico Sr. José Augusto. Ao anoitecer, o Dr. Raul Fernandes, pastor evangélico e o bacharelando J. Nicolau Lasytearan e Augusto Schawab, na praça da Liberdade, proferiram discursos, sendo aplaudidos pelo povo.

O encerramento dos festejos foi solene, havendo sessão cívica na sede do Tiro de Guerra 408.


    Outro Sete de Setembro que fez história foi o de 1936, cuja programação segue abaixo, patrocinada e divulgada pelo jornal lima duartino O Progressista, em sua edição de 06 de setembro de 1922

Por iniciativa de nossas agremiações educacionais e sociais e sob o patrocínio de O Progressista, Lima Duarte festejará amanhã, com raro brilho, o grande Dia da Independência Brasileira.

A comissão encarregada do programa convida a todos os lima duartinos para assistir a todas as partes, dando às mesmas o maior realce possível, nas horas marcadas:


PROGRAMA

Dia 7 de Setembro:

6 hs. Alvorada, salva de Tiros e hasteamento da bandeira pelo Tiro 408.

8hs. Desfile do Tiro 408, sob o comando do Sg. Instrutor Jorge José dos Santos e saudação do soldado à Bandeira, pelo professor Raul Fonseca.

9h30: Grande corrida da Cidade, prova patrocinada pela Prefeitura Municipal. Ponto de chegada na Parada EFCB.

13hs: Atletismo no Campo local, pelo Tirode Guerra 408, com o programa:

1ª prova – Cap. Braga: salto em altura;

2ª prova - Ten. Coelho: Salto em distância;

3ª prova – Sargento Segóbia: vivacidade;

4ª prova – Dr. Olavides: corrida de saco;

5ª prova – Dr. Frágolo: corrida de estafeta;

6ª prova – Sargento Jorge: luta de travesseiros;

7ª prova – Tenente Carraça: cabo de guerra;

14hs: Amistosa partida de foot-ball entre o combinado Parque Azul e Guarany F.C. de Cachoeira;

18 hs. Solene arriamento da Bandeira, no quartel do Tiro de Guerra 408.

18h30: Torneio misto de pin pong no tablado do Parque Azul;

20 hs: Sessão cívica no Ribalta Club:

Programa:

1. Musica

2. Abertura da sessão;

3. Hino à Bandeira, por alunos do Grupo Escolar;

4.Entrega de prêmios;

5. Declamações por alunos do Grupo

6. Música;

7. Discurso de apresentação do orador, pelo dr. Olavides de Oliveira;

8. O Dia da Pátria, conferência pelo ilustrado Prof. Luiz Milazzo, de Juiz de Fora;

9. Hino 7 de setembro, por alunos do Grupo;

10. A Patria, poesia pela senhorita Diva Duque;

11. Hino Nacional, por alunos do Tiro de Guerra 408;

12. Encerramento da Sessão.

21 hs. Elegante sarau dançante no pavilhão de Festas do Parque Azul;

Os festejos serão abrilhantados pela Corporação Musical Santa Cecília, sob a regência do professor Sebastião Ribeiro.

A comissão encarregada da execução do programa pede rigorosa observância dos horários, para não haver desordem na execução do mesmo


    Ao longo dos anos, a data seguiu sendo comemorada com solenidades, desfiles de personagens históricos, encenações, provas de atletismo e desfiles cívicos e escolares, há algum tempo desaparecidos.

    Junto com eles foram-se as bandas, as fanfarras, o Tiro de Guerra, os inflamados discursos, os carros alegóricos, as fanfarras escolares, os vistosos uniformes, as balisas…

    No palco dos desfiles, jaz agora um calçadão frio e solitário, bem o oposto da rua feliz e movimentada de outrora.

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Ruínas do Pico do Pião

 Uma capela no alto da serra.


    Chegar ao Pico do Pião, na Serra de Ibitipoca, traz agradáveis surpresas. Além do frescor dos ares e da vista que encanta, pode-se ver ali, em ruínas, um altar e um pavimento em pisos hidráulicos, restos do que foi um dia, uma bela capela.

    O local, ainda hoje de difícil acesso, faz-nos pensar nos motivos que levariam pessoas a erguer um templo naquele local, ermo e solitário, batido pelos ventos, longe de tudo e mais ainda, por que teria sido abandonada, entrando em ruínas?

    O projeto de se erguer uma da capela no Pião, surgiu nas primeiras décadas do século XX, quando a Serra Grande (nome regional dado à atual Serra de Ibitipoca), começa a ser pleiteada para sediar um hospital para tratamento de tuberculosos.

    Até ali, a Serra Grande era considerada Patrimônio da Santa, ou terra da Igreja, utilizada como pasto e para extrativismo de capim para colchões, macelas e plantas medicinais, de uso comum de todos os ibitipocanos.

    O Estado de Minas Gerais, em vista do empenho da Liga Mineira contra a Tuberculose, tratou de verificar a posse das terras, verificando a inexistência de documentação de posse por parte da Igreja, considerando-as terras devolutas, apesar de no senso comum, as terras integrarem o Patrimônio da Santa.

    A solução encontrada pela Igreja foi garantir a posse das terras, dando-lhes uso. Em 15 de agosto de 1925, é celebrada no Pico do Pião a primeira missa, diante de um cruzeiro e altar improvisado. Surge dai a idéia de erguer um templo no local, como forma de garantir a posse das terras para a Igreja.

Francisco Borges de Medeiros
e Gertrudes da Silveira Almeida
    Com aval do Bispo de Juiz de Fora, Dom Justino José de Santana, e sob o comando do Pároco de Bias fortes, Pe. Otávio Rodrigues Pereira, um grupo de fazendeiros, se incumbe da empreitada, chefiado pelo fazendeiro Francisco Borges de Medeiros. Estes constroem então uma capela, que foi denominada de Capela do Senhor Bom Jesus da Serra Grande ou Bom Jesus do Pião, benta em 10 de Agosto de 1932, pelo Padre Henrique Guilherme da Silva, Pároco de Lima Duarte. Padre Henrique torna-se até sua morte um entusiasta das festas e celebrações no local, a ponto de a capela ser conhecida popularmete como Capela do Padre Henrique.

    Ao longo dos anos seguintes, a capela seria local de celebrações e afamadas festas, com leilões e barraquinhas, animadas por bandas de música de Bias Fortes, Santa Rita de Ibitipoca e Lima Duarte, reunindo devotos de toda o entorno da Serra Grande.

    Seguindo em seu intento, o Governo do Estado de Minas Gerais acabou vencendo a disputa judicial, garantindo a posse das terras, reconhecidas como devolutas.

    A capela perde então seu objetivo real, agravado com o falecimento de Padre Henrique em 07 de agosto de 1937, entrando em abandono e estado de degradação e ruína.

Em 1940, estando totalmente arruinada, líderes da comunidade de Mogol, providenciaram o desmonte do restante do telhado, porta e paredes, deixando apenas o piso hidráulico e o altar em alvenaria. Com os tijolos removidos, ergueram no povoado de Mogol, na praça em que se localiza a Capela de Nossa Senhora dos Remédios, logo acima do coreto, uma pequena ermida, onde entronizaram a imagem do Bom Jesus, que ali permanece até os dias atuais.

  

Ruínas da capela no pico do Pião.

 Com a escolha de Campos do Jordão para a construção de uma grande estância para tratamento de tuberculosos e a posterior invenção da penicilina, a tuberculose é controlada. As terras da Serra Grande, agora do Estado , comporiam mais tarde a Fazenda do Ibitipoca, núcleo originário do Parque Estadual do Ibitipoca, inaugurado em 1973.

    As ruínas, desde então servem de poleiros para fotos e selfies, um triste fim para um local de tanta fé, devoção e tantas festas.



sexta-feira, 10 de junho de 2022

O deputado do trem

Francisco Valadares, o deputado do trem.


Desde 1873 cogitava-se da implantação de um ramal ferroviário em terras lima duartinas. Porém, somente em 1911, teria início a construção efetiva do ramal, sendo inauguradas em 1914, as duas primeiras estações do trajeto, Penido e Igrejinha.

As constantes paralisações das obras, motivadas por pressões contrárias por parte dos políticos paulistas e fluminenses, bem como de cidades vizinhas, fizeram surgir na imprensa e no próprio meio político, muitos defensores dos interesses dos lima duartinos e dos mineiros.

Dentre eles, destaca-se Francisco Valadares.


Francisco de Campos Valadares,
nasceu aos 24 de abril de….. em Pitangui (MG), filho de Benedito Cordeiro de Campos Valadares e de Maria Luísa Valadares, sendo bisneto de Dona Joaquina do Pompéu, célebre líder política do interior do estado de Minas Gerais.

Bacharel de Direito, exerceu por longos anos a advocacia, exercendo também a função de Promotor de Justiça em Juiz de Fora e Rio Pomba. Casou-se aos 07 de janeiro de 1901 com Constança Vidal Barbosa Lage Valadares (Constança Valadares) e não teve descendência. Em Juiz de Fora, participou ativamente da vida da sociedade, tornando-se diretor-gerente do Clube Juiz de Fora, conselheiro da Santa Casa de Misericórdia, redator chefe do Jornal do Comércio, presidente da Academia de Comércio e do Clube de Esgrima, Tiro e Ginástica. Também nessa cidade participou da Companhia Central de Diversões, primeiro passo para a construção do Cine-Teatro Central, já que era de sua responsabilidade recolher verbas que seriam repassadas à Companhia Pantaleone Arcuri, incumbida da construção do prédio.

Seguindo a tradição de sua família e atendendo a pedido dos cidadãos, ingressou na política sendo eleito deputado estadual em 1903, permanecendo até 1912, quando é eleito deputado federal por Minas Gerais. Por sua atuação forte e perseverante em prol dos projetos relacionados a Juiz de Fora e região da Zona da Mata, foi reeleito para as quatro legislaturas seguintes, permanecendo como Deputado Federal por Minas Gerais até outubro de 1930, quando a Revolução comandada por Getúlio Vargas extinguiu todos os órgãos legislativos do país.

Assumindo seu primeiro mandato em 1912, tomou a si a defesa da continuação das obras do Ramal de Lima Duarte, paralisadas desde 1914 em Penido. Já no final do ano, consegue a consignação de verbas no Orçamento da União, que ainda assim permaneceriam paralisadas, sendo retomadas efetivamente apenas em 1921.

Seguiu combativo e assíduo à tribuna da Câmara Federal, onde discursou reiteradas vezes em favor da continuidade das obras, promovendo o debate em torno da importância da obra para Minas Gerais e o Brasil.

Na Imprensa, assinou vários artigos e concedeu muitas entrevistas sobre o ramal de Lima Duarte, esclarecendo dúvidas e demonstrando, reiteradas vezes, a importância da obra para a Zona da Mata, Minas Gerais e o Brasil.


Resultado da luta do deputado Francisco Valadares, a ferrovia avança as obras e em 1923 as pontas dos trilhos atingem a localidade de Várzea do Carmo, atual Valadares, município de Juiz de Fora.

A inauguração da estação, ali erguida em terrenos doado pelo Coronel Camilo Guedes de Morais e às suas expensas, é realizada em 1º de Maio de 1924, recebendo o nome oficial de Engenheiro Navarro, que alguns dias depois, em 23 de maio do mesmo mês, é transferido para uma das estações recentemente inauguradas no ramal de Montes Claros. Com isso, a estação volta a ser designada como Várzea do Carmo, até que em agosto de 1924, uma portaria do Ministro da Viação determinou que fosse denominada oficialmente de Valadares, em homenagem ao deputado Francisco Valadares.

Ao saber da homenagem o deputado Francisco Valadares telegrafou imediatamente ao Ministro Francisco Sá, em 08 de agosto agradecendo a homenagem e consideração, mas solicitando que este desse à estação o nome de Camilo Guedes, como havia sugerido ao Ministro, já que este era o desejo da população e o mais justo, uma vez que o coronel era líder inconteste e total merecedor da homenagem.

Respondendo ao telegrama o Ministro Francisco Sá considerou que embora merecida a homenagem ao Coronel Camilo Guedes, considerava seu o direito de perpetuar na estação ora inaugurada o esforço infatigável do deputado Valadares como representante da região, de cujo esforço, pela realização daquele e outros melhoramentos que reclama, ninguém, melhor do que ele, podia dar sincero testemunho.

A Câmara Municipal de Lima Duarte também havia de manifestado a favor da homenagem ao deputado Valadares, manifestando assim seu agradecimento pelo empenho e dedicação pela continuidade das obras da ferrovia.

Assim a estação da localidade de Várzea do Carmo passou a ser denominada Valadares, nome este que passou a designar a povoação que se formou em redor da estação e que se desenvolveu, atualmente sede de distrito do município de Juiz de Fora, situada às margens da BR 267, entre Orvalho e Penido.

A atuaçao do deputado Valadares seguiu forte e incisiva, garantindo recursos que permitiram a tão sonhada chegada da primeira locomotiva à cidade de Lima Duarte em 08 de dezembro de 1925.

A pequenina estação ai inaugurada alguns meses depois, em 1º de março de 1926, foi chamada Parada Matosinhos, sendo depois oficialmente denominada Parada de Lima Duarte e estação Diocleciano Vasconcelos.

A rua que dá acesso à Paradinha recebeu a denominação de Rua Francisco Valadares, que conserva até então.

Uma justa homenagem a quem tanto fez pela implantação da nossa ferrovia.

Francisco Valadares faleceu em Juiz de Fora em 14 de novembro de 1933.


sexta-feira, 3 de junho de 2022

Praça JK

 

Praça de baixo: de circos e touradas a JK….


O povoado do Rio do Peixe desenvolveu-se inicialmente no entorno da atual Praça da Matriz, aproveitando as terras mais secas, apropriadas para a construção das casas de taipa. Os velhos caminhos que ligavam fazendas, aí se encontravam, gerando um “largo”, atual Praça Nominato Duque.

Neste largo, mais tarde denominado Largo da Liberdade, prevaleciam os eventos religiosos, as “festas da Santa” erguendo ranchos e barracas para leilões, venda de comidas e bebidas e apresentações de bandas e conjuntos musicais.

O caminho que levava às terras dos Delgado gerou a atual Rua Antonio Carlos, principal artéria da cidade. Ali se concentraram as moradias dos ilustres, o comércio, e as repartições públicas e administrativas, advindas com a elevação do povoado à vila e sede de municipio.

O Rossio, ainda sem a praça
1910. Acervo Afranio de Paula

A Câmara Municipal, seguindo a tradição herdada de Portugal, logo fez a aquisição de um terreno de grandes dimensões, no lado direito da rua principal, na época batizada de Rua General Osório (atual Antonio Carlos,) um pouco abaixo do Prédio da Câmara. gerando o Rossio, terreno público, fruído em comum, pelos habitantes da povoação.

Neste terreno aplainado e guarnecido de valas laterais de drenagem, eram realizados os festejos públicos, erguidos os circos, arenas de touradas e parques de diversões. Fotos antigas registram o terreno com uma dessas estruturas montadas.

Em 1886, é erguida num dos lados do Rossio a Igreja do Rosário. Em 1899, o Rossio perde espaço para o prédio do Fórum e Cadeia (atual Prefeitura), mantendo-se ainda o restante, entre a Igreja do Rosário e o Fórum, como terreno plano e descampado.


O Rossio por volta de 1930


Somente em 1930 a área seria transformada em praça ajardinada, com canteiros artisticamente construídos, plantio de árvores e arbustos artisticamente podados. Um piso de saibro, sempre mantido bem varrido, permitia a circulação entre os canteiros. Este jardim recebeu elogios de muitos que chegavam à cidade, por seu bonito aspecto.

A praça, conhecida pelo povo como Praça do Rosário, recebeu oficialmente o nome de Praca Paiva Duque, uma homenagem ao Dr. Nominato de Paiva Duque, tendo em 17 de abril de 1932, sido nela inaugurado pelo Prefeito Alfredo Catão, um sistema de iluminação com energia elétrica.

Em 1937, Lima Duarte recebeu a visita do Governador do Estado de Minas Gerais, que veio inaugurar o início das obras da estrada de carro para Bom Jardim de Minas. A Prefeitura, aproveitando o ensejo, presta-lhe homenagem e a praça passou a ser denominada

A praça em 1945
Praça Governador Benedito Valadares.

Em 20 de novembro de 1948, por força da lei nº 39, passou a ser denominada Praça Virgílio de Melo Franco, denominação que permaneceu até 11 de maio de 1951, quando voltou a ser denominada Praça Paiva Duque, por determinação da Lei nº 109, de 11 de maio de 1951, nome que parece não ter “pegado”, haja visto que seguiu denominada Virgilio de Melo Franco...

No final da década de 1960, a praça perde mais um pouco de sua área, ao ser erguido ao lado da Igreja do Rosário o atual prédio do Fórum. Paralelo a isso, é feita uma remodelação da praça, com corte de árvores e eliminação de canteiros. Ao centro, de uma grande área retangular com piso de lajes de concreto, foi erguido um monumento em concreto, com as iniciais “LD” revestidas em pastilhas cerâmicas, dentro de um corpo d’água circular, mais tarde preenchido com areia. Pela Lei nº 535, de 16 de novembro de 1976, a Praça Virgílio de Melo Franco passou a ser denominada Praça Juscelino Kubistcheck, nome que permanece até os dias atuais.

A praça assim permaneceu até 1984, quando em nova reforma, demoliu-se o “LD”. A informação divulgada na época, dizia que, no local intencionava-se erguer um coreto, nada se concretizando porém. Por essa época ganhou um busto de Juscelino Kubistcheck.

Uma última reforma foi verificada nos primeiros anos do novo século, quando a Praça ganhou a forma que hoje apresenta, com um relógio de sol no centro, logo alvo de vandalismo e nunca mais refeito.

No casario ao redor da praça funcionaram ao longo do tempo os Correios, o Parque Azul, local de grandes eventos musiciais e artísticos, a Rodoviária da cidade, o Posto de Gasolina do Sr. Dalmácio... Num de seus lados, num ponto estratégico, buscando segurança em tempos sombrios, está a Igreja Metodista, primeiro templo não católico da cidade.

A “Praça de Baixo”, segue hoje sua sina, animada pelo Bar Alternativa, consagrado point da cidade!


quarta-feira, 4 de maio de 2022

Praça Vigário Maia

 

Praça Vigário Maia: de roça de milho a praça pública



    No centro da cidade de Lima Duarte, servindo de pedestal para a velha Matriz das Dores, está a Praça Vigário Maia, popularmente conhecida como “Praça da Matriz”.

    A pequena ermida que deu origem à atual igreja foi erguida em 1808, em terras da Fazenda do Engenho de Inácia Maria da Assunção Delgado, num dos espigões que seguem diretamente do vale do Rio do Peixe ao alto da Serra de Lima Duarte, local escolhido certamente por sua importância para os povos que aqui habitaram antes da chegada dos primeiros mineradores e posseiros.

  
 
Em 1838, nos relatórios do Governo da Província de Minas Gerais, a futura matriz de Lima Duarte é descrita como “
capela de Nossa Senhora das Dores, situada numa elevação cercada por uma roça de milho com acesso por uma tronqueira. O templo de madeira, (certamente em reformas) está por concluir”.

    Sendo assim, a encosta onde hoje está a praça Vigário Maia, era primitivamente uma roça de milho, cortada pela trilha que dava acesso à Capela, cercada pelo cemitério.

Praça da Matriz antes de 1922
       O passar dos anos e elevação à sede de Paróquia, levou à extinção a roça de milho, formando-se em seu lugar um pasto de gramíneas, cortado por tosco caminho em diagonal.

    A grande reforma de 1891, transferiu do adro o cemitério, demoliu a velha Matriz de taipa e promoveu um amplo desaterro do morro, além de erguer um muro de arrimo ao redor da nova matriz. Ainda assim, a subida se fazia com dificuldade, por meio de toscos lajões de pedra assentados na encosta.

 Somente em1922, sendo pároco o Padre Carlos

Praça da Vig. Maia em 1926

Muller e Presidente da Câmara o Dr. Nominato Duque, aproveitando o ensejo das comemorações do Centenário da Independência do Brasil, promoveu-se o ajardinamento da encosta, construindo-se a longa escadaria que liga o adro da matriz à base da elevação, dividida em cinco lances num total de 50 degraus. Unindo os patamares entre os lances, rampas calçadas em pedra permitiam a ascensão da colina pelas laterais até o penúltimo patamar, do qual partia o último lance em direção ao adro do templo. A área recebeu grama, meio fios em pedra, bancos de cimento, arbustos podados artisticamente e algumas árvores, formando um conjunto de agradável aspecto. A parca iluminação era garantida pelos postes das ruas laterais, fornecida pela Companhia Regional de Luz e Força.

Praça Vig. Maia em 1940
    Assim permaneceu por mais de 40 anos. Por essa época a praça recebeu a denominação de Praça Vigário Maia, uma homenagem ao primeiro Vigário da Matriz de Nossa Senhora das Dores, Padre Joaquim da Silva Maia, que tomou posse como Capelão e Cura em 11 de agosto de 1845 permanecendo após 27 de junho de 1859 como Vigário, até falecer em 05 de julho de 1875.

    A partir de 1966, por ocasião da reforma da Matriz, a Comissão Reconstrutora procedeu o capeamento dos meio-fios e rampas com argamassa de areia e concreto, imitando calçamento poliédrico. Os arbustos e árvores foram substituídos por palmeiras, sendo instalados bancos de concreto, oferecidos pelo comércio local e modernos postes de iluminação. Por essa mesma época, as ruas que delimitam por dois lados a praça, foram calçadas com pedra, melhorando o acesso para pedestres e veículos.

    Anos depois a iluminação foi sendo substituída, recebendo luminárias com globos de vidro em meados da década de 1980, até os atuais postes. Houve também substituição das espécies ali plantadas, chegando ao estado atual. Flores de curta duração e farta florada, espécies utilizadas em cercas vivas também foram acrescentadas, formando belo aspecto por alguns meses, sem continuidade ou manutenção.

    Além disso, a velha praça recebeu apenas caiação de meio fios e pequenos consertos, sem nenhum outro melhoramento de porte. As ruas de pedra receberam cobertura asfática e as velhas palmeiras plantadas em 1966 foram cortadas e substituídas por outras espécies. Recentemente a longa escadaria recebeu corrimões, facilitando o acesso.

    


Num breve relato, assim se formou a Praça da Matriz!


quinta-feira, 7 de abril de 2022

Passos Públicos

Os Passos Públicos em Lima Duarte



    A Semana Santa passou. Depois de dois anos, por conta das restrições impostas pelas autoridades na pandemia de coronavírus, voltou a ser celebrada com atos externos, abertos aos fiéis e ao público.

    O ponto forte dessa semana é a recordação da Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, por meio da celebração in memorian, dos fatos ocorridos no ano 33 d.C. em Jerusalém, culminando com sua morte na cruz e ressurreição, tal como relatado nas Sagradas Escrituras.

    De novo, pudemos ver as belas procissões nas cidades ditas errôneamente “históricas”, recheadas de velhas tradições e devoções, com seu aparato de imagens em andores artisticamente ornamentados, irmandades e ordens decentemente vestidas, lanternas, cruzes processionais reluzentes e as tradicionais vias sacras públicas, celebradas nos “Passos”.

    O costume de relembrar os “Passos de Jesus” veio para a Europa com os cruzados e peregrinos, que retornando da Terra Santa, copiaram em suas povoações a Via Sacra de Jerusalém, a partir do século X.

    Da Europa, foram trazidos à América, por portugueses e espanhóis.

    Inicialmente marcadas apenas com uma cruz, as estações, ou paradas de oração, evoluíram para oratórios, altares e finalmente capelas, erguidas nas ruas tronco ou principais das antigas povoações pelas Irmandade dos Passos, formada por homens que promoviam e financiavam as construções, além de zelarem pelas imagens, paramentos, lanternas, cruzes, andores e todo o aparato de alfaias, utilizados nas celebrações dos Passos.

    Nas povoações maiores, antigas vilas-sede de município, as Capelas ou Passos, figuravam em número de cinco, tendo em vista que o primeiro e o último passo da série obrigatória de sete passos, eram montados na igreja que iniciava o cortejo da procissão, geralmente na Matriz, as vezes indo de uma Matriz à outra Matriz, caso de Ouro Preto, ou da matriz a uma capela de maior importância, caso de Mariana e outras vilas.

    Você sabia que Lima Duarte também já teve Passos?

    Segundo Alexandre Miranda Delgado, a Irmandade dos Passos da Paróquia de Nossa Senhora das Dores, foi ereta canonicamente por volta de 1890, ainda no Paroquiato do Padre Pedro Nogueira da Silva, que aqui exerceu a função de vigário de 1881 a 1906.

    A elevação da vila do Rio do Peixe a sede de município, em 1881, trouxe uma necessidade de modernização, manifestada no alinhamento de ruas, abastecimento d’água, iluminação pública com lampiões de carbureto, construção do Casarão da Câmara e Cadeia e Fórum.

       Na parte que concerne à Igreja, foram construídos o cemitério canônico e a Igreja do Rosário e demolida a velha Matriz, sendo erguida uma nova, ampla e bela, com aquisição de novas imagens, alfaias e paramentos.

    Nesse contexto, surgem também os passos públicos, para maior decência das procissões da Semana Santa, como se fazia nas outras cidades do estado.

    Consultando os livros da Irmandade que existiam na paróquia, o historiador observou que seus integrantes eram fazendeiros, servidores públicos federais, estaduais e municipais e comerciantes, todos ativos participantes da vida da paróquia.

    Essa irmandade promoveu a construção dos Passos na Rua Quinze de Novembro e Praça da Liberdade e adquiriu a bela imagem do Nosso Senhor dos Passos, que ocupava um dos retábulos da antiga Matriz de 1891, providenciando também a imagem do Senhor Morto, que junto com a imagem da Senhora das Dores, compunham o elenco mínimo necessário de imagens para os atos público da Semana Santa.

O Passo, visto no canto inferior direito


    Dos “Passos” públicos da Rua Quinze, atual Antonio Carlos, apenas de um temos foto. Situava-se onde hoje esta a Galeria Paula Guedes, entre a Associação Atlética e a Leiteria Central, e sobreviveu pelo menos até a década de 1960, quando ocorre uma “modernização” das construções no centro da cidade.

    Seguimos na pesquisa para identificar a localização dos outros passos.

Vista do Passo à esquerda, entre os dois sobrados.
Acervo E.E.P.D
    A Irmandade dos Passos, que tantos serviços prestou, não existia nas relações de associações religiosas da década de 1950, tendo possivelmente sido extinta anteriormente, fato sobre o qual seguimos em pesquisas.

    Os Passos, perdendo sua função, caíram em desuso, sendo demolidos um a um, empobrecendo o aparato das celebrações públicas de fé, que hoje admiramos em outras cidades.

    E você? Se lembra ou sabe da localização de outros passos?

    Interaja conosco e vamos reavivando a memória de nossa querida Lima Duarte, ajudando-a a reencontrar seus passos.




sexta-feira, 4 de março de 2022

Visitando Tineca França

Manoel Delgado da Silva - o Tineca França

    Já se vão 214 anos de fundação da primitiva Capela de Nossa Senhora das Dores, marco zero da povoação que hoje se chama Lima Duarte. Nas conversas e nas redes sociais, o desenvolvimento do município ainda é pauta frequente, apesar das sensíveis melhorias obtidas ao longo do tempo.

    Município com baixa arrecadação de tributos, Lima Duarte teve com atraso, todos os fatores de indução ao progresso. Quase todo o progresso técnico, social e científico, foi resultado de empreendimentos custeados pela iniciativa privada, que com seus próprios recursos, muitas vezes sem retorno ou lucro, trabalhou pela melhoria da qualidade de vida de todos.

    Olhando a História, pululam exemplos os mais diversos de cidadãos que, desprezando a inércia viciosa da política, tomaram a si a tarefa de promover o desenvolvimento, por meio de iniciativas e empreendimentos.

    Sobre um desses cidadãos, Manoel Delgado da Silva, nascido no dia 25 de março de 1878, trazemos um artigo, publicado no jornal O GATURAMO, 21 de abril de 1907.

    Este jornal, era publicado pelos alunos do Colégio Lima Duarte, estabelecimento particular de ensino básico e secundário, fundado por Pedro Paz. O Colégio tinha como atividade curricular um passeio pelos subúrbios da cidade, visando conhecer a realidade local.

Manoel Delgado da Silva
AMD

       Um dos locais visitados foi a Fazenda do Barulho, pertencente a Manoel Delgado da Silva, o nosso Tineca França.

    Sobre ela segue o texto abaixo, direto de 1907, no túnel do tempo: 

O município de Lima Duarte progride a olhos vistos dia a dia vencendo novos estágios na rota do Progresso.

Estabelecimentos industriais de primeira ordem, casas de comércio girando com avultados capitais, lavoura aparelhada com os mais aperfeiçoados os instrumentos de trabalho, criação de gado feita segundo moldes adiantados.

Todo este conjunto está a demonstrar a veracidade: Lima Duarte progride, e é tanto mais para ser notado este fato auspicioso, quando salientamos ou quando atentamos na indiferença dos altos poderes públicos do estado em relação o nosso município.

Há poucos dias, no costumado passeio que fazemos pela nossa zona Suburbana, tivemos ocasião de visitar um estabelecimento que em nosso espírito deixou indelével impressão.

Estávamos longe de supor que houvesse em nossa cidade uma oficina de fundição, montada com toda a proeficiência e aparelhada de modo a nela se poder executar obras e consertos em peças de ferro, o que até hoje só se podia fazer fora deste município e com grande dispêndio.

O senhor Manuel Delgado Silva é o proprietário e o diretor desta oficina, que honra sobremaneira o nosso meio industrial. Filho deste município, sem nunca haver saído daqui, sem ter cursado escolas superiores, o senhor Manuel Delgado da Silva, é no entanto, por um dom natural, hábil mecânico, sendo para admirar as provas que tem dado de sua capacidade em tal ramo.

Em sua fazenda, montou ele uma pequena máquina para o fabrico de manteiga, sem que importasse uma só peça. Estabeleceu também um telefone, ligando a fábrica à casa de residência e este aparelho delicadíssimo ele mesmo o engenhou, sendo o autor das diversas peças componentes.

Agora no lugar denominado Barulho, próximo à cidade, acaba de fundar uma oficina, com excelente torno para ferro, um torno para madeira, obra sua, uma serra para madeira, um moinho para fubá, e, omo que querendo coroar uma série de alentados e empreendimentos, vai montar o mesmo no local, uma excelente máquina para beneficiar arroz.

O capitão Jacinto Honório de Paula, outro benemérito de Lima Duarte muito tem auxiliado o digno conterrâneo Sr. Manoel Delgado da Silva. Agora mesmo trata ele de fazer uma caução aproximada da safra de arroz, influindo junto aos seus amigos para que venham em auxílio do distinto filho de Lima Duarte, que com a modéstia própria dos espíritos privilegiados, vai colaborando eficazmente na obra de engrandecimento do seu torrão natal.

Destas colunas erguemos um brado de animação ao senhor Manoel Delgado Silva digno de todo o amparo por parte dos limaduartinos, que se podem justamente orgulhar de um conterrâneo de sua envergadura.

LABOR OMNIA VINCIT. (O labor vence tudo) é a divisa do esforçado senhor Manoel Delgado da Silva.

Que Deus abençoe o seu trabalho fazendo com que os seus novos esforços sejam coroados de tudo êxito.”


    Que Deus inspire novos Tinecas Franças, a promoverem novas iniciativas!

    
Lima Duarte precisa e merece!



terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Um francês na Ibitipoca


 

SAINT HILAIRE EM IBITIPOCA


    Em 15 de fevereiro desse ano, comemora-se os 200 anos da visita do botânico francês Auguste de Saint Hilaire, à serra de Ibitipoca. Por meio de seu diário, transcrevemos, resumidamente, seus passos por nossa terra.

    Partindo do Rio de Janeiro, em 29 de janeiro de 1822, acompanhado de um novo arrieiro, seu amigo Laruotte e dois indios guaranis montados, Saint Hilaire tomou rumo diverso do que adotou em sua primeira viagem, buscando os caminhos que o levassem à povoação de Rio Preto, onde chega, oito dias depois.


06 de fevereiro de 1822:

    Após atravessar o Rio Preto, chega à povoação do Presídio do Rio Preto. Nessa época, o território de Rio Preto pertencia ao Distrito e Freguesia de Conceição de Ibitipoca, integrando o municipio de Barbacena.

    Assinalou que a povoação “...era dotada de apenas uma rua, larga e paralela ao rio (Preto), casas todas térreas, pequenas e com jardinzinho plantado de bananeiras...”

    Cumprindo as determinações legais, apresentou-se no Registro que controlava a entrada e saída da Província de Minas Gerais e apresentou as credecnciais que havia obtido de Dom Pedro I e do vice Presidente da Junta das Minas, sendo logo acolhido na casa do Comandante do Registro, onde pernoitou.


    07 de fevereiro de 1822

Seguindo viagem, serra acima, pela Estrada Geral do Rio Preto, atingiu o rancho de São Gabriel, três léguas adiante de Rio Preto, no dia 7 de fevereiro de 1822. Aí permaneceu colhendo amostras de plantas até o dia 10 de fevereiro.

    11 de fevereiro de 1822

Percorre mais um trecho do caminho, atingindo as cercanias do local hoje conhecido como Encruzilhada, onde a Estrada Geral do Rio Preto se bifurcava em dois caminhos: a esquerda a Estrada do Comércio, que seguia via Taboão a Bom Jardim, Turvo (Andrelândia), Madre de Deus e Piedade do Rio Grande, seguindo por São Miguel do Cajuru até São João Del Rei, e a direita a Estrada Geral da Polícia da Corte, que seguia pela Serra Negra, em direção à Barbacena.

Saint Hilaire, toma então a Estrada da Polícia, dobrando a Serra Negra e descendo pelo lado de Olaria, atingindo a Fazenda São João ainda em 11 de fevereiro, três léguas após São Gabriel.


    12 de fevereiro 1822:

Da Fazenda São João, a comitiva vai ao Rancho de Antonio Vieira, uma légua e meia adiante, encontrando-se com outros viajantes que, da vila de Oliveira seguiam ao Rio de Janeiro, aí pernoitando.


    13 de fevereiro de 1822

Seguindo viagem, à um quarto de légua de Antonio Vieira, atravessam, por uma ponte de madeira, “...um pequeno rio, chamado Rio do Peixe…”, próximo ao Pão de Angu, pernoitando no Rancho de Antonio Pereira.


    14 de fevereiro:

Seguindo de Antonio Pereira, por Várzea do Brumado e Rancharia, atinge a região dos campos. Deslumbrado, anota em seu dário: “...À vista dos belos campos que se apresentaram hoje aos meus olhos, não pude deixar de sentir verdadeiro aperto de coração, pensando que logo os deixarei para sempre…”.

Entrando na Vila de Ibitipoca, não pode deixar de externar sua admiração, pois “… embora cabeça de Distrito que se estende até Rio Preto, consta esta vila de algumas casinholas apenas, e do pior aspecto…” Ali, perguntando sobre que fazenda se situava mais perto da “serra”, é informado de a fazenda do Tanque é a mais próxima e para lá se dirige. Na Fazenda do Tanque, é acolhido e pernoita.


    15 de fevereiro

    Dirige-se à Serra de Ibitipoca, guiado por duas crianças da fazenda do Tanque. Botânico que era, foca sua atenção nas plantas, Fora estas, descreve um pequeno rio, que diz se chamar Rio do Sal (na verdade Salto), e visita, num dos rochedos, o Santo Antonio de Pedra, uma formação de líquens que assumia a aparência de um monge, vestido com hábito e livro na mão, ganhando o nome do santo padroeiro de Lisboa.

    Seguindo rio acima, encontra um rancho de taipa, coberto de sapé, com portas feitas com couro de onças abatidas na serra, habitado por uma família, egressa da região de Rio Preto. Com eles, o sábio francês comeu queijo, farinha e bananas.

    Com o chefe da família, estendeu longa conversação, contando-lhe este que para ali se estabelecer e poder criar animais, teve que matar dez onças, garantindo assim segurança para o gado.

    Convidado a servir-lhe de guia ao alto da serra, o bom homem logo se prontificou a fazê-lo, saindo todos a cavalo, logo após o almoço, em direção ao Pico do Pião.

    Ali, nos dias claros, anotou em seu diário, “avista-se até as montanhas dos arredores do Rio de Janeiro”. Descrevendo o abismo formado pelo paredão da serra para as bandas de Mogol e Bias Fortes, não deixou de exprimir um certo terror, provocado pela imensa profundidade do vale, “de espessas florestas em sombrios vales”.

    Impressionaram-lhe os pastos da serra, por sua qualidade e viço, capazes de alimentar prodigiosa quantidade de animais… Por um tempo perambulou ainda pela parte alta da serra, a colher amostras de plantas, receoso de causar enfado ao seu guia, parando a cada nova espécie que avistava. Como já se fazia tarde, retornaram todos ao casebre do Monjolinho, onde a anfitriã já os aguardava com um prato de palmitos e uma cuia de excelente leite, que comeram rápido, seguindo de novo ao Tanque, onde pernoitaram.


    16 de fevereiro

    Agradecendo a boa hospedagem aos hospedeiros, pôe-se a caminho seguindo em direção à Ibitipoca. Dessa vez, com mais tempo, observa e descreve melhor a impressão que a vila causa-lhe, anotando em seu diário: Atravessamos primeiro a vila de Ibitipoca, que conhecia mal, e julgava ainda mais insignificante do que realmente é. Fica, como já expliquei, situada numa colina e compoêm-se de pequena igreja e meia dúzia de casas que a rodeiam, cuja maioria está abandonada, além de algumas outras, igualmente miseráveis, construídas na encosta de outra colina. Não espanta pois, que inultilmente haja eu procurado, ontem, nessa pobre aldeia, os gêneros mais necessários à vida.”

    De Ibitipoca, segue em direção à fazenda da Ponte Alta, onde pernoita. Apesar da ausência dos donos, seus escravos consentem em que ele e sua comitiva ali pernoitem. Em seu diário, observa a simplicidade do interior da fazenda e a ocorrência de grande quantidade de araucárias.


    17 de fevereiro de 1822

    Partindo da fazenda Ponte Alta, voltando a lugares por que passou na viagem de 1817, Saint Hilaire chega à Santa Rita de Ibitipoca. A povoação causa-lhe melhor impressão, como se vê pelo que anotou em seu diário: Esta aldeia situada em agradável posição, à encosta de uma colina, não é senão, uma sucursal de Ibitipoca, embora importante. Compõem-se de uma única rua, mas ali se vêem algumas bonitas lojas”.

    De Santa Rita o francês e sua pequena comitiva seguiram para Barbacena, de onde a viagem se prolongou até São Paulo.

    Para visualizar o conteúdo completo da viagem acesse: http://brasilianadigital.com.br/obras/segunda-viagem-do-rio-de-janeiro-a-minas-gerais-e-a-sao-paulo-1822/